segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Memória seletiva


Aos poucos os ânimos se acalmam... as brumas se dissipam diante dos olhos e tudo vai ficando melhor. Porque a vida é assim... a arte de seguir em frente. E cada dia que passa vamos ficando melhores nisso, em juntar os cacos e recolocá-los. Nunca voltamos a ser o que éramos depois de quebrar o coração, mas a idéia é está mesma, nos tornarmos mais fortes, ainda que doa muito. 
Estou lendo um livro legal, presente do meu pai...  o livro é de Ricardo Setti, mas é sobre suas conversas com Vargas Llosa, Nobel em literatura em 2010... o engraçado é como me senti uma fraude diante do livro, porque nunca havia lido nada de Vargas Llosa, mas me interessei, apesar de ele ser totalmente avesso ao marxismo, que confesso, ainda tenho inclinações. 
Tenho vontade de escrever literatura sabe.... acho que sou muito óbvia nas crônicas e nos poemas, indiscretamente auto-biográfica, gostaria de ter genialidade para me camuflar em minhas obras, para deixar minha imagem discreta, para distribuir minhas neuroses entre vários personagens. E por isso admiro quem o faz. Mas voltando ao Vargas Llosa, ao falar de sua obra e sobre o fato de só ter escrito sobre seu país quando estava distante disse: "A distância purifica essa coisa tão complicada que é a realidade - a realidade imediata é uma imensa vertigem que ao mesmo tempo produz exaltação e paralisia". Acho que isso serve para a vida... a realidade é difícil, produz um turbilhão dentro da gente que mistura sentimentos. Mas a distancia começa a deixar tudo mais sereno, mais em paz... isso serve para os lugares, para os relacionamentos, para o tempo... quanto mais distante estamos, mais as imagens vão se purificando, mais a realidade vai dando lugar a idealização... por isso que quem está no nosso passado parece tão mais perfeito do que aqueles que estão no nosso presente... por isso que a infância é tão exaltada pelas pessoas. 
Eu particularmente acho que não tem fase da vida mais medonha do que a infância... somos vulneráveis, todos nos enganam, somos dependentes e com uma necessidade de sermos amados e cuidados que geralmente não é suprida por inteiro... ah, e fora como os nossos iguais, as outras crianças, são cruéis. Horrível, mas todo mundo acha lindo ser criança, todo mundo fica querendo voltar para trás. 
É isso, a realidade é dura, a memória é seletiva e somos quase sempre uma fraude... enganamos a nós mesmos com uma imagem nossa e dos outros que não é real. Acho que preciso ler mais para me sentir menos fraude, ler os clássicos, ler ao menos o mínimo necessário para poder nivelar um pouquinho o meu muito me achar com aquilo que realmente sou... e escrever... preciso escrever muito mais, porque assim entre poemas e crônicas, entre e-mail e cartas, registro o que realmente sinto no momento em que a coisa aconteceu, publico para mim mesma o que eu realmente achava daqueles que estiveram em minha vida e o que eu achava de mim... assim corro menos risco de idealizar ou crucificar alguém no meu coração... quem sabe assim passo a ter mais noção do real.

Nenhum comentário:

Postar um comentário