02/10/2011
Pastor Marcelo Gomes
Pastor Marcelo Gomes
Diante da morte tudo é diferente. A iminência da morte reconfigura a vida e redefine prioridades, valores. Ninguém permanece indiferente aos seus sinais. Ela prova, exige, expõe. Destrói fantasias de onipotência, esmaga o espírito arrogante e aniquila ilusões de imprescindibilidade. Desengana. Desmascara. A morte devolve-nos à nossa condição original: pó. Nas palavras do Padre Vieira: “Deu o vento, levantou-se o pó; parou o vento, caiu. Deu o vento, eis o pó levantado; estes são os vivos. Parou o vento, eis o pó caído; estes são os mortos. Os vivos pó, os mortos pó; os vivos pó levantado; os mortos pó caído; os vivos pó com vento, e por isso vãos; os mortos pó sem vento, e por isso sem vaidade. Esta é a distinção e não há outra”.
A morte causa medo, desconforto. Sua inevitabilidade e mistério fazem tremer os mais corajosos. Chega sem avisar, não negocia com ninguém nem faz acepção de pessoas. Impõe-se. Desconhece posição social, condição econômica, planejamento pessoal ou idade. É universal. Mas não segue padrão: pode vir mansa, suave, ou trágica, estarrecedora. É imponderável. Dificilmente se faz desacompanhada de seu fiel escudeiro, o sofrimento. E não poucas vezes deixa-o tão à vontade, por tanto tempo, que acaba sendo desejada, pedida. Caprichosa, não? Como Kierkegaard escreveu: “Enquanto a morte é o supremo risco, tem-se confiança na vida. Mas quando se descobre o infinito de um outro perigo, tem-se confiança na morte. Entretanto, quando o perigo cresce a ponto de a morte tornar-se a esperança, o desespero é desesperar-se de nem sequer poder morrer”.
Por tudo isto, a morte é um convite à decisão. Sua realidade pergunta-nos sobre nossas mais íntimas convicções e desafia-nos a uma tomada de posição urgente (afinal, nunca se sabe). Quem somos? Como estamos? Em quê cremos? Estaremos preparados? Jesus disse que nenhuma pessoa é capaz de acrescentar uma única medida ao curso de sua vida. Também contou uma parábola sobre um homem que colheu com fartura, ajuntou em celeiros e celebrou sua sorte, mas ele não sabia que seria aquela a última noite de sua vida. Importa que estejamos preparados e somente a fé poderá nos preparar. Somente a fé nos falará de uma vitória final sobre a morte. Somente a fé nos ensinará sobre o amor, o cuidado e a presença contínua de Deus conosco mesmo em face da morte. Somente a fé nos ajudará a seguir em frente apesar da força da morte. Cristo venceu a morte.
O triunfo de Jesus sobre a morte é um conforto e um incentivo ao coração que confia. Abre os olhos para o futuro de Deus, onde não haverá mais morte (tragada foi a morte!), e restaura o vigor. A esperança inunda a alma e a alegria torna-se viva. O “adeus” não passa de um “até breve” e a saudade não fica com a última palavra. Dos que foram na velhice afirma-se que descansam de suas fadigas e suas obras os acompanham. Dos que foram na juventude, às vezes tão precocemente, afirma-se que foram poupados de muitas tristezas e provações para entrarem no gozo de seu Senhor. Gente da qual o mundo não era digno. A morte é assumida como dádiva. Viver é Cristo e morrer é lucro. Como nas palavras de Eugene Peterson: “Nenhuma vida é completa até que haja morte. A morte marca o limite. Ser humano é morrer. Ao morrermos, atestamos nossa humanidade. A morte aprova, mais do que encerra, a nossa humanidade”.
Tudo, porém, pela fé. Não sem lágrimas ou dor para os que ainda precisam ficar..
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