terça-feira, 19 de março de 2019

Angústias Milenares


Passagens milenares se colocam no diálogo do agora. Quantos indivíduos trocaram energias similares em outros tempos e contextos, embevecidos das mesmas angústias? O rigor da articulação das palavras nos é próprio e peculiar, mas o conteúdo possivelmente não. Sinto nas expressões de Beauvoir a mesma dor ao questionar os privilégios de Sartre, e através dele, questionar a metade privilegiada do mundo todo, entregando a nós, de seu infinito interno, um tesouro sem precedentes. Talvez também nos diários de Zelda contivesse tal energia no confronto a F. Scott Fritzgerald que além de silenciar, roubava-lhe as palavras... Ah quantas palavras nos são constantemente roubadas, eles tiram daqui e levam para lá, roubam de lá e trazem pra cá... Confronto misturado, movimento por dentro do próprio movimento. E no Conto de Aia, e nas histórias de Virgínia Woolf, e em cada postagem angustiada querendo mudar o mundo de cada uma destas mulheres que em algum dia e em algum lugar perceberam que o mundo não é bom para nós. Na verdade mais que isso, perceberam e puderam dar nomes aos seus monstros, algozes, angústias. Poder de representações, que coisa poderosa são as palavras, quando são escutadas, é claro! O que, em nosso caso, é raro! Mas a palavra essencial é também silêncio, ou talvez totalmente o silêncio, presença serena do nada criativo. Confesso que as vezes gostaria de gozar deste lugar... me sinto cansada de tanto falar. Exausta é a palavra. Gostaria que meu silêncio fosse escutado como o silêncio deles o é. Mas se eu não falar, gritar, confrontar eu não existo. Minha existência precisa ser constantemente provada, nunca se deixar determinar, porque é o tempo todo determinada, determinada a retraimento e ausência de mim mesma, a ser preenchida por eles, com suas pretensões de onipotência... existência que nasceu determinada por aquilo que não sou. Empenhos de perguntar e desempenhos de responder.... jogo infinito de linguagem se transformou em nossa única saída, das profundezas dos pressupostos, uma cadência regular, uma precarização relacional para relacionar. Nas constelações de junturas dinâmicas... eu sustento o meu ser, mas junto a mim se encontra o meu querer transformar o mundo contestado por meu amor por você!

Ilustração de Joaquim Cartaxo

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